sábado, 8 de janeiro de 2011

Curto e seco:



Hitchens está doente. Tem cancro. Alguns crentes reuniram-se num Pray For Hitchens Day, rezando e pedindo a Deus para que Hitchens saia ileso da doença. Crentes que, de forma propositada, pedem a Deus para que este altere algo que ele próprio planeou, ao ser omnisciente e ao criar quer Hitchens, quer o cancro. Crentes que, na prática, pedem a Deus para alterar aquele que é, por definição, o seu plano perfeito. Crentes que, sejamos honestos, são desonestos. Eles querem alterar o mundo de Deus, porque acham-no injusto. Porque uma das decisões tomadas pelo seu Deus, sentem-no, é exagerada ou merece correcção. São crentes que, no fundo sem o admitir, admitem que há algo de errado com este sistema. Talvez isto sirva de reflexão para alguns deles; que os faça parar de rezar e começar a fazer perguntas.
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25 comentários:

Tiago Santos disse...

"Está doente algum de vós? Chame os anciãos da igreja, e estes orem sobre ele, ungido-o com óleo em nome do Senhor; e a oração da fé salvará o doente, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados." Tiago 5:14-15

o q eles estão a fazer não vai em nada contra a biblia. Existe a vontade permissiva de Deus e a vontade soberana. A soberana são coisas que Deus decide e é como ele quer por muito que nós oremos. A permissiva são coisas que por orar-mos e muito pedirmos ele nos dá.

A historia de Jesus acalmar a tempestade (Mateus 8:23-27) é um exemplo prático disto. Eles acordaram Jesus, que estava a dormir tranquilamente pq sabia que nada de mal ia acontecer, mas porque os discipulos pediram muito ele acalmou a tempestade. Não acalmou porque iam todos morrer, mas pq eles pediram.

Mas agora dou-te a minha opiniao. Caso hitchens não queira ser curado por Deus nao acho que por muito q eles orem q ele irá ser curado. A pessoa decide se quer aceitar ou não e se acredita ou nao. Mas é a minha opinião, nao te sei dizer se está correcta.

Renato Rocha disse...

Olá Tiago! Tudo bem?

Compreendo que o que eles estão a fazer não vai contra a Bíblia; vai, isso sim, contra a ideia de que a decisão de Deus é perfeita independentemente daquilo que aconteça. Faças das duas vontades de Deus, a permissiva e a soberana. Se Deus estiver, neste caso, a abrir a possibilidade de curar Hitchens se ele o pedir, parece-me a mim um exemplo de chantagem. No fundo, Deus não cura Hitchens se ele não o pedir, se ele não “aceitar”; isto, claro, ignorando o profundo problema que advém da ligação entre “aceitar” Deus e ver a sua doença curada. Bem vistas as coisas, acreditar em Deus é a única forma de Deus fazer um favor a Hitchens, curando-o. Isso não só seria desonesto da parte de Hitchens, que não acredita por não ter razões e não por não querer (o que significa que não pode decidir se quer aceitar ou não, mas isso é outra conversa). O problema aqui é que Deus faz o mesmo que eu faria se, ao ver uma criança a morrer à beira da estrada, não a ajudar se ela não mo pedisse. Visto de fora, eu seria um monstro. E pensar que Deus coloca Hitchens numa situação semelhante só para que este o possa finalmente aceitar é, convenhamos, grotesco. Deus, no fundo, não cura Hitchens porque quer, porque é bom, ou porque acredita que salvar um homem de uma doença terminal traria mais felicidade ao mundo do que a morte do mesmo; Deus cura Hitchens se alguém lhe pedir. Isso, a meu ver, não é uma característica de um Deus bom; é a característica de um Deus a querer ser elogiado.

Para finalizar: se Deus conseguisse “converter” Hitchens, não esperar que ele “comece” a acreditar mas sim revelar-se de uma forma que levasse Hitchens a tornar-se crente, Deus estaria, com esta atitude, a fazer repensar milhões de ateus e agnósticos em todo o mundo. Se Hitchens surgisse como cristão e defendesse abertamente esta posição, posso jurar-te que até eu ouviria o que ele tinha a dizer. Se Deus quiser salvar milhões de ateus de um Inferno certo, tem aqui uma oportunidade única e valiosa.

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Renato Rocha disse...

Tudo isto é uma possibilidade interessante, mas não retira um gravíssimo problema (que acho que já discutimos): foi Deus quem criou o cancro em primeiro lugar. Quer o de Hitchens quer o de todas as crianças que, neste preciso momento, sofrem dores tremendas por causa da sua doença terminal. Por o que espera Deus? Um pedido? A “aceitação” destas crianças? E se estas não o fizerem, Deus deixa-as morrer? E porquê criar o cancro eu primeiro lugar? Suponho que esta seja uma das “vontades soberanas” de que falas. Deus decide; mas isso não me impede de avaliar essas decisões como coisas temíveis. Desafio-te a pensar sobre isto (eu sei, é um argumento emotivo e sem peso lógico; mas ainda assim): sempre que imaginares um Deus omni-benevolente, pensa se para Deus não seria possível criar um mundo totalmente igual ao nosso, mas sem as crianças com cancro. Sem a SIDA. Ou sem a leucemia. E pergunta a ti próprio porque é que o mundo é como é. Não encontrarás, se avaliares a questão de boa fé e em concordância com o Deus em que acreditas, que haja outra pessoa responsável por isto que não Deus. Mais um argumento emotivo: achas que quero “aceitar”, mesmo que pudesse simplesmente começar a acreditar de um momento para o outro, um Deus que criou a leucemia?

Desculpa o testamento… Grande Abraço!

Tiago Santos disse...

nao peças desculpa meu. tass bem =)

nao te vou responder a tudo, mas so queria relembrar-te que inicialmente o mundo foi criado por Deus, sem dor nem morte nem pecado. Adão e Eva é que decidiram afastar-se de Deus e com essa acção surgiram consequências. Depois disto Deus criou todo um plano para entregar Jesus para nos livrar do pecado que todos herdamos por ser-mos "filhos" Adão (acho que percebes o que quero dizer. somos da linhagem de Adão pois ele foi o primeiro homem).
Já tivemos esta discussão e o que me disseste é q não achas que realmente houve livre arbitrio mas foi tipo uma "cilada" da parte de Deus. É aqui que acho que discordamos maioritariamente. nao penso que seja por avaliar esta questão de "má fé" mas sinceramente acho que houve liberdade de Adão e Eva para tomarem a sua decisão.
Existem muitas teorias e opiniões em relação a isto dentro do meio cristão/evangélico. esta é a minha.

Renato Rocha disse...

Adivinhaste a minha resposta, assim não vale!
Tens razão. No entanto, uma correcção: não penso que tenha havido uma “cilada” da parte de Deus, porque isso queria dizer que Deus fez de propósito e de forma maliciosa. Eu acho apenas que Deus, por ser omnisciente, já sabia que aquilo ia acontecer; e sendo omnipotente, podia tê-lo evitado. Se não o evitou sabendo quais as consequências do que ia acontecer, ele é o responsável; e culpar Adão e Eva é ser-se desonesto. Bem vistas as coisas, aquela não foi uma decisão livre de Adão e Eva, no sentido em que eles não olharam um para o outro e disseram “Bora ali comer da árvore”. Foi a serpente, leia-se Demónio, quem os influenciou; e quem criou o Demónio apesar de já saber o que ia acontecer no futuro? Deus.
Além disso, todo o castigo que daí adveio foi uma decisão de Deus. Foi Deus quem definiu todo o sistema de pecado e castigo que “hoje” existe, do qual Adão e Eva não faziam a mínima ideia.
Talvez me possas explicar melhor porque é que não concordas comigo. Gostava muito.

Tiago Santos disse...

Eu gostava de te explicar o porquê de ver as coisas desta maneira, mas penso que se torna uma discussão mais filosófica e não biblica.

Para mim apesar da criação ser de Deus ele tem uma personalidade. Uma maneira de agir intrinseca. Parte dessa personalidade é Ele ser justo.

Ha vários maneiras de olhar para um problema e várias opinioes de justiça. Por isto é que digo que se torna filosofica esta discussao.

Deus tem este "sistema de pecado e castigo" porque é o que é guiado pela sua noção de justiça. Em que nós somos responsáveis pelas nossas acções independentemente das nossas boas intençoes, convencimento, etc. Sabendo claro que nós erramos a torto e a direito Deus criou um plano para nós podermos pedir o seu perdão e ser-mos imediatamente limpos. Não é so "esconder os erros" mas limpá-los. Este plano foi realizado por Jesus.
Claro que podes refutar que não concordas com a justiça de Deus. Percebo as tuas duvidas neste sentido. E sou te sincero quando digo que sou parcial. Acredito em Deus porque experiencio a sua existência todos os dias através da morte de Jesus. Tendo isto não me custa confiar na Sua justiça.

Renato Rocha disse...

Compreendo o que dizes, mas isso levanta um problema. O Deus que descreves não é omnisciente ou omnipotente. Encontra-se “limitado” pela sua própria personalidade, que molda o seu comportamento. A justiça divina não é sua decisão, é uma consequência da sua natureza; e isso faz dele um Deus dependente de si próprio, que não tem total poder sobre si próprio e sobre como funciona o Universo.

Mesmo isso não afasta o problema; no fundo o que me dizes é que a única razão por que Deus criou o “sistema” como ele é, é porque isso é uma reflexão da sua personalidade, o que apenas me faz pensar que a sua personalidade é bastante imoral.

Quanto à tua observação final, parece-me importante fazer a distinção entre acreditar em Deus e confiar na sua justiça. Mesmo que eu “começasse” a acreditar em Deus, seria necessário reformular todo o meu sistema moral e ético para aceitar a sua noção de justiça.
Nem me parece que esta seja uma palavra correcta, porque “justiça” parte do princípio que alguém que comete um crime paga na proporção desse crime. O “sistema” que Deus criou é, provavelmente, o mais injusto que já vi, uma vez que depende apenas de uma coisa: aceitar Jesus Cristo. A partir daí, os pecados são perdoados, sejam eles pedofilia, roubo, corrupção ou desonestidade.

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Renato Rocha disse...

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No entanto, há um crime que Deus não perdoa: não acreditar nele. Uma justiça que pune alguém bom, que viveu toda a sua vida dedicado aos outros mas que simplesmente não acredita em Deus, e perdoa alguém que passa toda a sua vida a espalhar a dor e o sofrimento pela sociedade não é uma forma de justiça; ou, pelo menos, uma forma de justiça com a qual eu poderia alguma vez concordar.

Chegamos a um “beco sem saída” nesta discussão, que é a subjectividade pessoal. Defendeste até aqui a tua posição com algum tipo de argumentação, apresentando as tuas razões; mas agora a tua resposta é simplesmente “Eu sinto Deus, e isso responde a todas as minhas perguntas”. Isso pode ser satisfatório para ti, mas espero que compreendas que não o é para mim nem para ninguém que quer verdadeiramente compreender a tua posição.

Direcciono-te para uma gravação onde um apresentador daquele programa que penso já ter ter mostrado, a Atheist Experience, formula melhor do que eu a sua objecção a esta “justiça”. Se quiseres ouvir penso que seria positivo. Não que ele seja alguma autoridade, uma vez que discordo com ele bastantes vezes. No entanto, gosto particularmente deste pequeno “discurso”.

http://www.youtube.com/watch?v=qDpZxpBSfcc
Grande abraço!

Tiago Santos disse...

Mais uma vez nao te vou responder a tudo, mas acho importante sublinhar um ponto.

O que falas em comparar alguém que "fez bem toda sua vida" com alguem que fez todos os males possiveis na sociedade é algo inexistente, pelo menos pra Deus, e pra mim já agora.
A verdade é que todas as pessoas pecaram. (Romanos 3:23) E assim, para Deus não faz diferença a quantidade de pecados.
Se tu achas que alguém que cometeu 10 pecados mereçe maior castigo que alguem que cometeu 2, compreendo-te mas a verdade é que prefiro como está.

Ninguem é salvo pela quantidade de coisas boas que fez na vida.

E vamos ser práticos, se tu achas mais injusto um método que pede a crença num sacrificio dum individuo, num arrependimento genuino e numa mudança de estilo de vida, do que um método que exige que as pessoas façam mais coisas boas do que más pra serem salvas, não acho sequer que estejas a ver bem as consequências desse método.
Se todos vivessemos com um peso durante toda a vida que cada coisa má que fizessemos iria pra sempre perseguir-nos e de alguma maneira teriamos de fazer uma coisa boa para voltar a "equilibrar a balança" duvido que as pessoas deste sistema fossem felizes.

reformulo o que disse antes, não concordo com o teu ideal de justiça simplesmente pq é demasiado idealistico. não acho que ninguem consiga viver e "safar-se" com ele. Acho que é por isto que Deus fez as coisas como são.

Anónimo disse...

Tudo isso ignora a minha objecção ao sistema de justiça de Deus. A mim pouco me importa se uma pessoa que faz 10 coisas más deve ser mais castigada do que uma que faz 2 coisas más; o problema com o sistema de justiça que tu apresentas e defendes é que independentemente da quantidade de coisas más (que é diferente de “pecados”), basta aceitar Jesus para se ser perdoado.

Ok, o exemplo que dei é exagerado. Deixemo-nos de exageros e criemos uma situação mais verosímil: duas pessoas com exactamente o mesmo percurso de vida e o mesmo “equilíbrio” entre coisas boas e más acordam um dia. A pessoa A chega à conclusão que é ateu, e por consequência não aceita Jesus Cristo. A pessoa B mata sete pessoas com uma pistola, mas tem a oportunidade de aceitar Jesus antes de morrer e arrepende-se do seu crime. Segundo o teu sistema de justiça, só uma destas pessoas irá ser castigada. Faço-te uma pergunta directa: achas justo?

O problema no teu sistema de justiça, independentemente da “quantidade de coisas boas” que alguém fez, é este: o único critério para o castigo ou absolvição de um indivíduo, o único, é aceitar Jesus Cristo. Daí deduz-se, e correctamente, que a única acção que não possui qualquer perdão, é a não-crença.
Falas do “método que exige que as pessoas façam mais coisas boas do que más para serem salvas”, como se estivesses a representar a minha ideia de justiça, o que não é o caso. Primeiro, nego a legitimidade desse “salvamento”, uma vez que, como já discutimos, trata-se de Deus a salvar-nos de um sistema que ele próprio instituiu. Segundo, eu não exijo que as pessoas suplantem a quantidade de mal que fazem com acções boas; eu defendo que as pessoas devem ser castigadas ou pagar pelas coisas más que fazem na proporção do quanto essa acção é negativa. Significa que um assassino poderá passar o resto da sua vida a servir em programas de voluntariado social, mas mesmo assim terá de pagar pela vida que roubou a alguém. Isto é lógico: é a razão porque um assassino obtém mais anos de prisão que alguém que assalta uma gasolineira.

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Renato Rocha disse...

(enganei-me e publiquei o comentário anterior como Anónimo)

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Dizes-me que “preferes como está”, porque não achas que alguém que tenha feito 10 coisas más, em contraste com alguém que só fez 2, deva receber um maior castigo. Se assim é, convido-te a admitires que pensas que todo o nosso sistema judicial está minado. Se para ti é preferível um sistema onde alguém se arrepende e sacrifica outra pessoa em seu lugar, a um sistema que pune as pessoas na proporção do mal que fizeram, não sei o que mais te hei-de dizer. Chego à conclusão que discordamos violentamente em relação ao que achamos justo ou não.

Além disso, utilizas um critério que só tem significado para ti, que é o de pecado. Para mim, a noção de pecado não existe no dia-a-dia porque não sinto que deva haver nada intrinsecamente errado. Para muita gente, é um pecado ser-se homossexual; para mim e para muita gente, não há nada de errado em ser-se homossexual. Pecado ou não, uma coisa pode ser errada ou não. São conceitos independentes, e misturá-los é partir do princípio que ambos concordamos nisso quando não é o caso. A tua noção de pecado só pode ser “levada a sério” quando me conseguires provar a existência de Deus, uma vez que é Deus quem define o que é pecado ou não; da mesma forma que dizeres “ser homossexual é errado porque Deus assim o define” não é uma resposta convincente, uma vez que terias de 1) Provar que existe um Deus, 2) Provar que esse Deus concorda contigo em relação à homossexualidade, 3) Que todos nós deveríamos seguir as regras impostas por esse Deus. Não é tarefa fácil.

Tiago Santos disse...

Renato, eu não te quero provar absolutamente nada.
O meu unico objectivo era explicar-te conceitos biblicos como aquela "historia" da vontade permissiva/soberana, o facto de todos ter-mos pecado/errado (não acho que faça sentido entrar numa discussão sobre a diferença entre os 2), etc.
Quando a conversa começa a ser sobre se algo é justo ou não a discussão torna-se, na minha opinião, mais filosófica do que outra coisa.

Tendo isto dito, concordo contigo quando dizes que a discussão daqui não pode sair. Mas só pra responder as tuas ultimas perguntas:

Todas as pessoas cometeram erros e pecaram. Sendo assim nenhuma mereçe a vida eterna, quer matem ou não 32 milhoes de pessoas. A unica maneira de serem salvas é por Jesus. Assim, respondo-te a tua pergunta: Sim, acho justo POIS no plano global, ambas erraram e nenhuma mereçe ser salva. Mas uma escolheu ser salva por Jesus, a outra apesar de ser boa pessoa decidiu não acreditar (não acreditar é uma decisão, espero que nao haja conflito neste sentido)

A tua outra questão: o sistema judicial está muito bem como está POIS os juizes não são Deus, e não conseguem ver o arrependimento e a crença genuina das pessoas.
Visto que Deus consegue, Ele pode fazer as coisas de maneira diferente.

Renato, tu podes ter a opinião que quiseres, usar a noção de Amor, Justiça, Igualidade, que quiseres. Mas existe a hipotese de estares errado. Caso sejas uma criatura criada por Deus, é perfeitamente compreensivel que o teu intelecto não esteja ao nivel Dele. Não te vou provar nada, mas gostava de te ver a tentar ver se isto funciona ou não. E a unica maneira de o fazer, é pela experiência e não pela razão.
Abraço

Renato Rocha disse...

Não podia discordar mais contigo. Já falámos muitas vezes sobre isto, e tu conheces bem o meu ponto de vista. Aqui reside o porquê de achares o sistema de Deus justo e eu não; é que tu pensas que acreditar em algo é uma escolha. Tu pensas que eu escolhi ser ateu, o que significa que Deus está mais do que justificado em castigar-me pela minha escolha.

Segue o teu próprio conselho. Esquece por momentos a razão e aceita a experiência: escolhe algo em que não acredites e procura ESCOLHER começar a acreditar nisso. Seja Krishna, unicórnios, a terra ser plana, a existência de naves espaciais, a conspiração reptiliana; qualquer coisa. No dia em que fores capaz de começar a acreditar, com toda a honestidade e determinação, em qualquer uma destas coisas simplesmente porque escolheste fazê-lo, dar-te-ei razão.

Por outro lado, no dia em que fores capaz de compreender que acreditar em algo não é uma escolha consciente, perceberás a injustiça inerente a um Deus que não se manifesta de forma a que qualquer pessoa o possa “experienciar”, e que castiga única e exclusivamente aqueles que não o aceitam. Tu pensas que isso é uma virtude do sistema porque não compreendes o que significa não acreditar. Tu não acreditas em milhares de outros deuses que centenas de civilizações fabricaram; e, ao que julgo, não te sentaste a uma mesa a “escolher” se acreditavas ou não na Afrodite, ou em Thor, ou em Krishna. A falta de evidências para a existência desses deuses foi suficiente, ou não foi?

Tu pensas que um ateu é alguém que olhou para duas opções, acreditar ou não, e escolheu a segunda; nada podia estar mais longe da verdade. E a tua noção de o quanto é justo esse sistema baseia-se nesta má compreensão. Tudo o que precisas de fazer para compreender e comprovar por ti próprio o que estou a fazer, já que defendes a experimentação, é aceitar o meu desafio acima referido: começa a acreditar em qualquer coisa em que não acreditas actualmente. Tenta.

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Renato Rocha disse...

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Recusas-te a discutir o que é ou não justo, mas aceitas, por definição, que o sistema de Deus é justo; recusas-te a provar o que quer que seja, mas pedes-me a mim que “comece” a acreditar sem qualquer razão; e falas na minha “descrença” como se fosse uma decisão consciente, como se eu no fundo soubesse que Deus existe mas no fundo não quero admitir.

Repito outra coisa que já disse nas nossas conversas: diz-me, então, o que devo fazer para experienciar Deus; sim, porque “escolher” acreditar não é suficiente. Parece-me óbvio que, se Deus existe realmente, haverá forma de o experienciar. Tu já me deste sugestões, que eu experimentei. Não resultaram, e acusaste-me de falta de honestidade. Não sei o que fazer mais, senão aceitar a justiça de um sistema que me condenará por, aparentemente, não ter pedido a Deus que se demonstre com suficiente honestidade. Se não vês a injustiça num sistema destes, não sei o que te dizer. Estamos em cantos tão opostos no que toca a noções de justiça e humanidade que nem sequer podemos concordar em conceitos básicos (a propósito; sim, há uma diferença importante entre “pecado” e “aquilo que está errado”; independentemente de o veres ou não).

Para deixar bem definidas as duas questões que levantei aqui:

1) Uma vez que defendes que acreditar em algo é uma escolha consciente, desafio-te a experimentar começar a acreditar em algo no qual não acreditas actualmente, como Krishna, unicórnios, a Terra ser plana ou fantasmas.

2) Dá-me um exemplo de uma experiência que, sem ter em consideração a razão, eu possa viver para experienciar Deus.

Desculpa-me se o meu discurso parece alterado. Não fico alterado contigo pessoalmente, porque sabes que te adoro e considero-te um dos meus maiores amigos. Crescemos praticamente juntos, caramba. Mas são as tuas ideias que me despertam este tipo de discurso. Mais uma vez, desculpa-me; mas por favor, responde-me.

Um abraço!

Tiago Santos disse...

Renato, tudo bem. Não penses que iria ficar magoado ou qualquer coisa contigo por seres honesto nas tuas emoções e opiniões. Isso é algo que gosto sinceramente.

Mais uma vez não te vou responder a tudo, mas estou genuinamente interessado em responder-te a segunda pergunta:
Vem comigo a uma cena que se chama "Retiro de Jovens". É da minha igreja, já fui mts de vezes. Basicamente o pessoal sai durante 4 dias e fica todo junto num sitio na lousã. Dormimos lá em quartos e temos reuniões. Também ha ramboiada mas é principalmente para tarmos uns com os outros, com Deus e aprendermos cenas. Oradores especiais, etc.
É em Março, nas férias do carnaval. Podes ir embora quando quiseres e, na altura já devo ter carta, eu proprio te posso levar para um comboio onde possas voltar.
É isto que me refiro em relação a uma experiência.

Compreendo o que dizes em relação a acreditar sem experienciar não é algo possivel. Então experimenta isto. É tudo o que eu te peço. Digo-te sinceramente que me ia deixar mto feliz. És um amigo importante na minha vida.

Tiago Santos disse...

É das melhores experiências que se pode ter para viver Deus. É onde estamos mais com Ele, é onde aprendemos mais Dele..

Renato Rocha disse...

Acho uma excelente ideia. Teria, no entanto, de estudar os dias (por causa das aulas de dança) e os custos. Quando é exactamente? Quanto custa? Onde é?

No entanto, gostaria que procurasses responder à primeira pergunta que fiz. Trata-se de algo importante, uma vez que se achas mesmo que acreditar é uma questão de escolha, a minha visita ao Retiro seria redundante. Ou seja, se defendes que a forma que tenho de sentir Deus é através de uma experiência pessoal no Retiro, significa que a "escolha" é irrelevante. Certo?

Tiago Santos disse...

os pormenores pudemos tratar no msn, se quiseres. É nas férias do carnaval, na lousã. Boleias, podes vir comigo. Ida e volta.

Em relação a tua primeira pergunta:

Sou sincero quando te digo que depois do teu penultimo comentário percebo um pouco melhor o que te referes ao dizer que acreditar não é uma escolha consciente.

Então, pra responder directamente a tua pergunta:
Acreditar é uma decisão. Ainda assim, acho que ninguem toma esta decisão sem algo que lhe aponte naquela direcção. Como uma experiência pessoal.

Uma experiência pessoal e uma decisão acho que são complementares e não mutuamente exclusivas.

Tu colocas esta decisão como algo inconsciente porque se calhar, para ti, é uma resposta inata. Tenho uma experiência com Deus, logo Ele exise, logo acredito nele.
Não acho que todos sejam assim. Não acho que seja tão facil, para algumas pessoas, acreditar que aquela experiencia foi mesmo Deus e não uma "coincidência" ou algo do genero.

Por fim, acho que isto, se for explorado racionalmente torna-se uma discussão filosófica e esse não é o meu objectivo porque não acredito muito na fiabilidade das conclusões que poderiamos alcançar.

Eu ficava muito feliz se viesses comigo ao retiro. Matavamos saudades, ia ser divertido e podias tirar as tuas duvidas. Ter a tua experiência pessoal com Deus.

Renato Rocha disse...

O acto de acreditar divide-se em duas “fases”: a primeira é quanto recebes informação exterior que antes não tinhas (não podes acreditar em algo que não conheces ou do qual não tens qualquer tipo de dados); a segunda, que como dizes e muito bem, funciona quase inconscientemente: é o “começar” a acreditar. Por exemplo: eu exijo algum tipo de informação para acreditar que o prato que acabei de confeccionar está salgado. Toda a gente me pode dizer “Renato, isto está intragável”: eu provo, saboreio, dou a provar a outras pessoas e chegamos à conclusão de que o prato está realmente salgado. Nesse momento, posso dizer que acredito que o prato está salgado demais. No entanto, esta minha “crença” não se baseia numa decisão no processo de aceitação ou não da proposição inicial “o prato está salgado”. Eu não escolhi aceitar que o prato está salgado; o que aconteceu é que todas as informações que recebi sobre o prato, que incluem o que eu experimentei e a opinião de todas as outras pessoas, me levaram a concluir que o prato está salgado; por isso é que não dizemos normalmente que acreditamos em certas coisas que, por serem evidentes, são consideradas factos: Eu chamo-me Renato, e acredito que o meu nome é Renato; no entanto, não se coloca um problema de “crença”. É simplesmente assim.

Deixemos as analogias e passemos à preposição “Deus existe”. Para eu acreditar que Deus existe, devo primeiro receber informações: uma definição de Deus (o teu Deus é diferentes do Deus islâmico, por exemplo) e evidências que apontem para a sua existências: coisas no mundo que não poderiam ser de outra maneira se não fosse a presença de Deus. Só depois desta análise, posso passar para o próximo “passo”, que é acreditar ou não na preposição “Deus existe”.
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Renato Rocha disse...

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Aqui está o problema; não na fase do acreditar ou não (daí defender que não é uma decisão consciente), mas na fase da “informação”: a definição de Deus e as suas atitudes são, a meu ver, muitas vezes contraditórias ou logicamente inconciliáveis; e o mundo e os fenómenos que muita gente diz terem mão divina encontram explicações diversas que não necessitam de Deus para nos elucidar sobre porque o mundo funciona como funciona. O meu mais profundo e pessoal sentido moral vai contra muito do que é defendido por Deus ou pelos seus crentes, e todo o Universo pode ser explicado por leis perfeitamente naturais. Como disse Laplace quando apresentou os seus estudos sobre Júpiter e Saturno e Napoleão lhe perguntou onde estava Deus naquilo tudo, “Senhor, não vejo necessidade nessa hipótese”.


Muito simplesmente, eu olho para o mundo e, por aquilo que consigo ver, não avisto Deus em lado nenhum. E pior: desde as contradições bíblicas, aos erros no criacionsimo, às contradições ou às falácias lógicas, tudo me aponta para que a ideia de Deus não tem peso, não correspondeu ao seu ónus da prova. Daí surge a minha posição em relação a Deus, que é não aceitar a preposição. Por isso, não acredito que ele existe; isto é valido, e pelas mesmas razões, para os outros Deuses (islâmico, judaico, hindus, etc).

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Renato Rocha disse...

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Também tu, conscientemente ou não, segues a mesma ordem de pensamentos. Se eu te propuser que Zeus existe, tu recusarás imediatamente a minha afirmação e poderás até acusar-me de estar maluquinho. Não porque não queres acreditar em Zeus, mas sim porque toda a informação que tens sobre Zeus aponta-te para uma conclusão e uma conclusão apenas: muito provavelmente, Zeus não existe. Logo, és ateu em relação a Zeus. Por mais que tu queiras e decidas “vou começar a acreditar em Zeus”, algo em ti se recusará a aceitar tamanho salto intelectual, uma vez que toda a tua experiência te faz chegar à conclusão que Zeus não deve existir. Repara bem nisto, porque é importante: tu não decides não acreditar em Zeus; a tua posição de descrença em relação a Zeus é a consequência directa daquilo que tu sabes.

Desculpa se fui chato ou complicado demais, mas é só para perceberes que a minha posição em relação a Deus não é o resultado de uma escolha consciente. Eu não decidi não acreditar; essa posição foi a consequência de tudo, absolutamente tudo o que eu conheço do mundo e que poderia entrar na “balança”.

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Renato Rocha disse...

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Daí que te peça razões e argumentos para justificares a tua posição. Eu não tenho problemas em acreditar em Deus, apenas não vejo razões para isso e, consequentemente, não consigo começar a acreditar de um momento para o outro.

Para terminar: Sei que defendes a experimentação acima da razão, mas também essa hipótese apresenta problemas. Já me descreveste várias vezes algumas experiências pessoas, em que “sentiste” Deus. Muito daquilo que descreveste nas nossas conversas eu também já o senti. Emoções fortes, sensações de paz imensa, ou uma espécie de vertigem emocional que te deixa sem ar: filmes, músicas, paisagens, objectos artísticos, frases de pessoas de que gosto ou experiências totalmente desprovidas de qualquer ligação com Deus já despertaram em mim o mesmo tipo de emoções que tu descreves como sendo a inegável presença de Deus. E enquanto tu me dizes que uma determinada experiência tem a mão de Deus, outro crente noutro Deus pode dizer-me o mesmo, ou outra pessoa pode dizer-me que são os meus antepassados, e uma quarta pessoa garantir-me que se trata de uma conspiração reptiliana. Como vou distinguir e perceber qual deles me diz a verdade, se é que algum deles está certo? É através da razão, da objectividade e daquilo que pode ser medido, visto, observado, estudado, analisado e reflectido. As emoções, com a sua subjectividade inerente, são pessoais; e as suas interpretações também.

(desculpa o testamento)

Tiago Santos disse...

Na boa Renato. Apesar de grande eu li tudo o que disseste e não quero que penses que só respondo ao que leio.

Mais uma vez não te vou responder a tudo, e sou-te sincero qnd digo que não quero entrar na discussão neste sentido. O que te proponho, e já te disse antes, é que experimentes algo e depois, informadamente, formes a tua opinião. Já te disse e repito que acho perfeitamente lógico que caso Deus exista Ele seja completamente inexplicável e imcompreensivel pela mente humana e pela ciência. A unica coisa a fazer, é experimentar e depois "logo se vê o que Ele me diz".
Eu não quero provar-te a existência de Deus. Nem defender as minhas decisões ou o meu estilo de vida.
Não quero defender as minhas opiniões. Só quero oferecer-te esta hipótese. Se estiveres mesmo à procura de uma resposta, não vejo porque é que não has-de ir...

A unica maneira de saberes qual deles diz a verdade é "provares o prato para ver se está salgado".

Renato Rocha disse...

Eu gostaria muito de ir ao Retiro, e se não apanhar nenhum dia em que dou aulas de dança com certeza que podes contar comigo (tenho a certeza que a Vanessa me deixa ir!). No entanto, já fui contigo à Igreja, e apesar de ter apreciado a experiência, não senti as coisas da mesma maneira que tu e que as outras pessoas que me rodeavam. O erro pode ter sido meu; tu me dirás.

P.S.: acabaste de comparar Deus a um prato salgado, não sei se reparaste.

Tiago Santos disse...

sim. fiquei particularmente orgulhoso da minha analogia :p
Deus não vai ficar chatiado comigo =P

Quando tiveres noticias da tua disponibilidade diz-me! Assim não tenho de ser eu a perguntar-te e não passo por chato.

Grande abraço, Renato!