sábado, 25 de dezembro de 2010
Um euro de Natal
A defesa da privacidade pública
Aviso os alunos e seus encarregados de educação que as classificações do 1º período se encontram afixadas em pauta nas vitrinas disponíveis na escola e também publicitadas no GIAE online.
O director, em 21.12.2010
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
quinta-feira, 9 de dezembro de 2010
Smith e as Sereias - Fim
Num dos caixões, o corpo magro de um rapazinho louro, cujo aspecto de menino bonitinho e inocente estava violentado pela maquilhagem pesada e pelas bochechas chupadas.
Noutro dos caixões, uma sereia lindíssima, de longos e pálidos cabelos louros, com as pálpebras cerradas respeitosamente sobre dois enormes e sedutores olhos azuis.
Noutro dos caixões, uma outra sereia, também esta lindíssima, de ondulados cabelos ruivos que por alguma razão tinham perdido a sua cor viva. As suas mãos delicadas estavam colocadas confortavelmente sobre a sua barriga lisa, junto ao soutien feito com conchas lilases.
E no último dos caixões, um homem jovem, de cabelo castanho, faces simples e roupas ainda mais, conservando ainda um pequeno esgar sarcástico e matreiro nos músculos rígidos da boca.
O Autor entrou na pequena Igreja e observou a enorme Pescada de pedra, no topo do altar, e os quatro caixões colocados no centro, uns ao lado dos outros, abertos. À entrada da igreja estava um livro de visitas aberto e em branco, com uma Bic por estrear ao lado de um jarrão de corais. O Autor dobrou-se, agarrou na caneta, pensou no que escrever e desistiu. Pousou a caneta e caminhou até ao centro da sala.
O cheiro a mofo da Igreja misturava-se com o cheiro dos químicos que fluíam de dentro dos caixões, provavelmente responsáveis pela conservação dos corpos debaixo de água. E quem quer que tivesse tratado do funeral tinha feito um bom trabalho. Os corpos estavam bem concervados, realistas. Pareciam, vá lá, vivos. Como se tivessem existido até alguns segundos atrás e só agora mesmo, neste momento, tenham fechado os olhos.
O Autor dobrou-se e depositou junto aos caixões um enorme ramo de algas coloridas, colhidas nas estufas reais agora desertas e em ruínas. Por alguma razão aquele ramo de algas tinha sobrevivido, impávido e alerta, a toda a ruína que parecia agora cobrir o Palácio Real. Até a Igreja, observava o Autor, tinha buracos na parede, algas-daninhas a crescer aos cantos e um ou outro animal marinho a espreitar por entre fendas e buracos sujos. Era como se tudo à sua volta tivesse morrido, e também merecesse estar dentro de um caixão.
O Autor ficou de pé a olhar para os quatro caixões e o silêncio da situação incomodou-o. Subitamente aquele funeral parecia-lhe estúpido por ser desprovido de qualquer pessoa a chorar. Que chorasse ele, ao menos; mas não conseguia. Não era dado a esse tipo de emoções, se bem que já estivesse estado mais longe.
As causas daquelas mortes continuavam a ser um mistério, mas o Autor pesquisava por entre a sua memória à procura de qualquer referência. Talvez a culpa fosse sua, uma qualquer negligência da sua parte; ou um acidente de percurso, incalculável e impossível e prever.
Sentou-se pesadamente num dos bancos de madeira agora apodrecida, e colocou o queixo sobre as mãos. Ficaria por ali um pouco, a prestar o seu respeito aos mortos. Há que respeitá-los por aquilo que fizeram em vida.
Horas depois o Autor levantou-se do banco e olhou uma última vez para os quatro caixões. Não gosta de despedidas, especialmente se a pessoa de quem se despede não lhe pode responder com um “Até sempre”, ou “Não é preciso ficares assim”, ou ainda “São coisas que acontecem, faz parte da vida”.
O Autor sentiu-se inútil ali de pé. Deu um jeitinho no ramo de algas, que entretanto escorregara ligeiramente, e caminhou de mãos nos bolsos e cabeça baixa até à saída da Igreja, e daí para fora do Oceano.
Fim
Todas as Terças e Quartas nunca mais haverá episódios do Smith e as Sereias.
quarta-feira, 1 de dezembro de 2010
Hoje apetece-me ridicularizar as crenças religiosas de alguém…
Eu (não) votei no australiano
A Wikileaks veio, acha ela, salvar o planeta. Podemos agora estar mais descansados com a eficácia da democracia quando um australiano de 39 anos se auto-intitula como paladino da liberdade de expressão, e faz carreira a revelar informações confidenciais como a revista Maria revela os próximos episódios das novelas da TVI. O que interessa se estes confrontos diplomáticos poderão destruir sensíveis equilíbrios entre os países, e quem sabe trazer problemas práticos e perigosos? Claro que é justo roubar material classificado do Governo, porque isso sim é transparência democrática. E o que interessa é que um australiano de 39 anos e o seu site se sentem no direito de revelar informação secreta dos maiores governos justamente eleitos pelas populações. Para defender a democracia, estão a ver?
Smith e as Sereias - episódio 36
Previamente, em Smith e as Sereias, Jack tem de vestir uma fatiota humilhante, Smith ouve a conversa ameaçadora dos tripulantes e um carrinho de fruta aparece do nada dentro do Nautilus.
Eu sempre soube que era bom para a porrada, mas aquela situação era demasiado desequilibrada até para mim. Eles eram uns vinte, enormes, musculados, maioritariamente suados e com cicatrizes que mostravam que estas eram autenticas máquinas de destruição de tabernas. Não resisti, portanto. Eles agarraram-se, ainda a pingar sumos de várias frutas esmagadas, e arrastaram-me para dentro da salinha onde tinham estado reunidos.
Sentaram-me numa cadeira e inclinaram o candeeiro na minha direcção. Para me intimidar.
- Isso é para eu ver melhor? – perguntei. Aprendi nos filmes que os bons espiões e heróis de acção são sarcásticos quando se encontram perante o perigo. Queria imitar o paradigma.
- O que é que tu ouviste da nossa conversa? – perguntou o tripulante da cicatriz, que não só parecia ser o líder do grupo como o mais mal disposto de todos.
- Hei, o que te aconteceu na cara? – perguntei – Tentaste dar banho a um gato?
Outra coisa que aprendi nos filmes de espiões é que o herói sarcástico leva sempre nos dentes. Isso é importante, porque nenhum vilão responde às piadolas do herói com festinhas ou um batido de morango. Por isso, e obedecendo à regra geral, o tipo com cicatriz atirou o seu punho de um lado ao outro da sala, encontrando a minha cara a meio caminho e provocando-lhe o mesmo efeito que um camião a alta velocidade a chocar contra a minha cabeça. O meu nariz rebentou, e senti um líquido quente a descer-me pelo pescoço. Era sangue.
- Ah ah ah – disse eu, procurando esconder a horrenda dor – Só isso?
O homem ia atirar-se a mim outra vez.
- Não, não, espera, espera.
Ele parou. Eu olhei para ele. Tinha três opções. Admitir que os tinha ouvido, e assim ameaçar os meus amigos, e assim levar mais um murro; mentir-lhe, e ele ia perceber e dar-me outro murro; ou lançar mais outra bomba de ironia, que me custaria mais um murro. Pensei. Pensei. Pensei.
- Deves ser muito solitário, essa cicatriz deve afastar a senhoras – disse eu, e fechei logo os olhos. Pimba, o meu nariz dobrou-se agora para o lado oposto, e senti mais sangue a descer-me pelo queixo. Aquilo doía, seriamente; e o sarcasmo à herói de cinema não estava a resultar tão bem como eu pensava.
- Ouçam, muito recentemente aprendi uma coisa chamada altruísmo. É excelente. Significa sacrificarmo-nos pelos outros. E isso inclui levar murraças no nariz. Por isso podem bater-me, mas não vou vos dizer o que sei.
- Óptimo – resmungou o tripulante de cicatriz – Tragam a sereia ruiva.
A sereia ruiva…
- Oi, calma lá – ergui-me na cadeira – Vocês não se atrevam a fazer mal à Ariel!
- Ela é a tua namorada, não é? – perguntou o tripulante da cicatriz.
- Vocês não lhe vão tocar… - estava a ficar zangado. Não me lembro te ter ficado assim antes.
- Então vamos ter de fazer aqui um acordo.
De nariz desfeito, a ser ameaçado, com sangue a escorrer pela cara, estava disposto a levar mais uma centena de murros antes de arriscar colocar a Ariel em perigo. É extremamente estereotipada, esta ideia do protector da dama indefesa; mas a verdade é que o herói sarcástico deu lugar ao herói protector. Olhei para o tipo da cicatriz com olhos de mau mas subjuguei-me logo:
- Digam-me logo o que querem e deixem-me ir.
- Manténs a boca fechada e nós mantemo-nos longe da tua namorada. Não sei se já reparaste, mas vocês estão mais ou menos fechados dentro do nosso submarino. Percebeste?
Eu percebi. Percebi logo. Levantei-me e saí porta fora. Tinha sangue na camisola, em cima do sumo da fruta. Olhei para mim mesmo e pus-me a descer corredor fora, com a promessa de um dia ser eu a partir o nariz àquele selvagem.
***
- O que raio te aconteceu? – perguntei eu, quando vi entrar Smith dentro do quarto. O nariz dele era uma batata gorda e empapada em sangue seco, e tinha a camisola toda suja. Foi ajudá-lo a sentar-se, e corri à caixa de primeiros socorros que me tinha lembrado de trazer na mala.
- Tropecei no carrinho das frutas – explicou-me ele, a colocar um pano empapado em líquido de medusa do Pacífico.
- Estás a brincar, certo? Alguém te fez isto. Quem?
- Uma melancia.
- Smith, a sério!
Ele olhou para mim e depois para o tecto. Respirei fundo.
- Tenho de te pôr o nariz no sítio.
- Como assim?
Levei as mãos ao nariz e toquei-lhe ligeiramente na batata vermelha.
- Au!
- Calma, maricas.
Dei-lhe um safanão e o nariz foi ao sítio com um estalo. Smith deu um salto.
- Agora vais contar-me o que se passou.
- Andava a correr e fui de caras com uma carrinha da fruta que ali andava a passar.
- Como num mau filme de perseguições?
- Exactamente. Ouve, tu tens de confiar em mim. Confias em mim?
- Sinceramente? Não. Diz-me, Smith. Quem te fez isso?
- Ninguém.
E a conversa acabou ali.
***
Chegou a noite. Fiquei na cama de baixo, não me importo. A Ariel não faz barulho a ir à casa de banho. Vamos tentar dormir agora. Vamos sim.
Não consigo dormir. A verdade é que não deixo pensar no Jack. Pobre Jack… Meu querido Jack… Não é que eu goste dele, necessariamente. Quer dizer, mais ou menos. Não é sim nem é não. É um mais ou menos; mas um mais ou menos definitivamente a cair para o lado do menos. Mas menos não significa que eu não goste dele, eu acho-o simpático, e querido, e honesto, e fantástico, e estupidamente lindo. Aquele cabelo. Como é que ele consegue? É tão suave. No outro dia toquei-lhe sem querer no cabelo. Parece uma peruca de seda. É maravilhoso. Um dia talvez tenha filhos lindos como ele. Especialmente se ele fosse o pai. Não por querer que ele seja o pai, é só mesmo porque se ele, SE, numa hipótese remota, remotíssima, me engravidasse involuntariamente como o Smith fez à Ariel, eu seria uma mulher feliz. Não por ele ser pai, nada disso, muito menos por ele depois ter de viver comigo, e dormir ao meu lado, e ajudar-me a mudar as fraldas, e trazer-me o pequeno-almoço à cama com uma rosa e aquele sorriso delicioso e querido e de rapaz maravilhoso. Nada disso mesmo.
Calma, Lilith. Adormece. Estás a ficar um bocado obcecada demais com a tua mania de não queres que o Jack seja o teu marido para o resto da vida. Não achas que estás a exagerar? Acalma-te. Pensa noutra coisa. Pensa na actualidade mundial, por exemplo. Alguma notícia interessante?
No outro dia e eu o Jack estávamos a ler o jornal, e o Jack comentou que…
***
- Hoje portaste-te bem, Jack – disse o Capitão Nemo, bebericando outro batido de algas que Jack lhe preparara. Estava sentado ao seu enorme cadeirão no seu escritório pessoal, uma sala oval com uma enorme lareira a um lado e uma prateleira enorme do outro, coberta com livros, manuscritos, equipamentos electrónicos e uma impressionantemente realista maqueta do Nautilus em cima de uma elegante base de vidro.
- Obrigado, Capitão – disse Jack com uma pequena vénia. Estava estafado, queria ir dormir e tirar a porcaria da peruca em forma de alga que lhe fazia comichão no pescoço.
- Este batido está excelente.
- Obrigado, Capitão.
- Sentes-te humilhado?
- Oh não, nada disso. Está tudo bem, senhor.
- Estava a fazer uma pergunta sincera, e espero que a resposta esteja ao mesmo nível.
- Sinto-me mais humilhado do que nunca, Capitão.
- Bom. Muito bom – o Capitão virou-se para a lareira e continuou a bebericar o batido –Amanhã espero-te aqui às seis e meia. Podes ir.
Todas as Terças e Quartas, novos episódios de Smith e as Sereias
terça-feira, 30 de novembro de 2010
Smith e as Sereias - episódio 35
Previamente, em Smith e as Sereias, a viagem com o objectivo de localizar Rose e reunir certas individualidades para defender o Palácio está, finalmente, prestes a começar. Sim, as personagens vão finalmente sair da porcaria do Palácio, onde têm estado desde há mais de dois meses. Iei, certo?
O Nautilus tremeu, vibrou, fez uns barulhos metálicos ameaçadores e, como um gigante a roncar, afastou-se lentamente do leito de algas, terra e conchas que formava o terreno atrás do Palácio. O enorme submarino subiu, empurrando enormes quantidades de água para baixo e formando remoinhos temporários que agitaram todas as figuras da Corte, reunidas para se despedirem da expedição.
De dentro do Nautilus, Ariel e Lilith observavam o Palácio a diminuir-se como que por magia, à medida que se afastavam dele e as poeiras submarinas lhes toldavam as observações.
- Aqui vamos nós – murmurou Lilith. Ariel atravessou o pequeno quarto e começou a tirar a roupa da mala.
- Dormes no de cima ou no debaixo? – perguntou, apontando para o beliche.
- Como achas que está o Jack? Há uma hora que não o vimos…
- Eu fico no de cima, então – Ariel subiu para a cama superior e experimentou a almofada – Uau, esta cama é confortável. De certeza que não te importas de ficar por baixo?
- É que o Capitão pode estar a obrigá-lo a carregar com coisas. Ou a humilhá-lo. Ou a tentar matá-lo. As possibilidades são imensas – choramingou Lilith, abraçada a si própria como se estivesse com frio.
- Vais ter de te acalmar. O Capitão só quer um assistente pessoal, nada mais. Aliás, ele é um amigo pessoal do Pai. Achas que vai acontecer alguma desgraça aqui dentro?
***
Smith andava a explorar. De mãos nos bolsos, caminhar descontraído, ocasionais assobios, sentia uma inegável nostalgia. A vida de submarino não era assim tão diferente da sua longínqua vida de marujo num navio. A tripulação passava por ele sem o cumprimentar, correndo para os seus postos ou levando mensagens de um lado ao outro do submarino. Aquela correria era, para Smith, uma lembrança física dos bons tempos passados a dar voltas ao mundo. Por isso, estava feliz.
Passou pela biblioteca, um salão gigantesco coberto por livros. Original, não é? Passou pelo salão de refeições, com uma mesa compridíssima e, no topo, um cadeirão em forma de concha aberta que com certeza pertencia ao Capitão Nemo; pela escadaria, que fazia a ligação entre os vários andares do Nautilus. Demorou-se junto a uma planta de emergência, pendurada num corredor. Estava mais ou menos a meio do Nautilus, no 2 andar. O primeiro era o andar das máquinas e das cozinhas, o segundo onde estava a biblioteca, o salão de refeições, as salas de observação e controlo do submarino e os aposentos do Capitão; e o terceiro, estava exclusivamente dedicado às habituações da tripulação e dos convidados. Bocejou, entediado com todos aqueles minutos perdidos a obter informação sobre o submarino, e olhou para o enorme quadrado que representava, na planta, o escritório pessoal do Capitão Nemo; e perguntou-se se Jack estaria ali, a fazer favores ridículos ao Capitão que, era claro, o queria humilhar.
- Boas tardes – disse uma voz atrás de si. Smith virou-se, e por pouco não reconheceu o amigo. Jack tinha um chapéu em forma de algas, como uma peruca; ao pescoço trazia um colar, que a toda a volta segurava tentáculos compridos de polvos de várias cores. À cintura, uma bolsa de ferramentas. E nos pés, uns chinelos feitos a partir de uns desconfortáveis corais australianos.
- Pela saúde da Pescada – murmurou Smith, de boca aberta – Que fizeram contigo? Pareces o animador de um parque temático!
- Sinto-me lisonjeado – respondeu Jack com um sorriso sarcástico, encostando-se ao corrimão das escadarias – O Capitão obrigou-se a vestir esta farda. Diz que é tradição os seus assistentes se vestirem a rigor.
- A rigor não. Tu estás a ser humilhado!
- Não te esqueças, Smith, que há apenas alguns dias me barriquei neste mesmo submarino, ameaçando a vida dos tripulantes e a própria máquina, e que isso enfureceu o Capitão Nemo.
- Claro que não me esqueço, isso foi ainda no outro dia.
- Pronto, era só para o caso de estar alguém a assistir à nossa conversa e não perceber o porquê disto tudo – segurou os tentáculos que trazia ao pescoço e engoliu em seco.
- Espera só até a Lilith te ver.
- A Lilith não me pode ver assim – Jack parecia ter o orgulho ferido – Sinto-me ridículo.
- Cá para mim – reflectiu Smith – é neste preciso momento que a Lilith e a Ariel aparecem.
Lilith e Ariel apareceram, virando uma esquina. Deram com Jack vestido daquela maneira, e Ariel soltou uma gargalhada. Lilith, essa, parecia derrotada e à beira do choro.
- Jack… Que te fizeram…?
- Tenho de ir buscar um batido de algas-reais para o Capitão – disse ele, acelerando corredor abaixo e procurando a todo o custo esconder a peruca. Lilith correu atrás dele, obrigando-o a consolar-se com a sua companhia. Ariel aproximou-se de Smith, deu-lhe um beijo discreto mas sentido e apoiou-se no seu ombro, vendo Lilith desaparecer atrás de uma esquina.
- Isto é bárbaro! – resmungou Ariel, sorrindo abertamente – Pobre Jack…
- Não exageremos – respondeu Smith, segurando-lhe a mão – De tudo o que lhe podia acontecer de terrível isto é sem dúvida o mais suportável.
***
- Proponho – disse um dos tripulantes, fumando uma cigarrilha – que o obriguemos a correr todo nu pelo submarino.
- Eu proponho que lhe seja cortado o órgão. E não é um órgão qualquer. É especificamente o órgão.
- Eu cá – sugeriu outro tripulante – proponho que alguém o esventre imediatamente.
- Calma! – exclamou outro tripulante, o mais velho de todos, e a confusão à sua volta acalmou. A maioria da tripulação do Nautilus estava reunida (e apertada) numa sala minúscula, com um único candeeiro por cima das suas cabeças que oscilava como um pêndulo discreto e banhava todos os homens com uma luz directa e conspiratória – Há que planear uma vingança, sim. Mas deve ser cuidada. Deve ser maravilhosamente orquestrada de maneira a não levantar suspeitas.
- Foi o que eu disse – resmungou um tripulante com tatuagens nos braços – Alguém que o esventre imediatamente, mas à noitinha, para não se ver quem foi.
- É necessário calma… - pediu o tripulante mais velho pela segunda vez. Uma voz grossa levantou-se do outro lado da sala.
- Calma?
Todos os homens se viraram para ver de onde vinha a voz.
- Calma? – repetiu a voz grossa do tripulante com uma enorme cicatriz na bochecha, encostado a um canto da sala de braços cruzados – Vês a minha cara? Os belos traços, desfeitos por um louco! Achas que andar com uma peruca e com tentáculos pendurados ao pescoço é suficiente? Não. Tudo menos calma. A vingança chegará fria e selvagem. E não demorará. E serei eu a orquerestrár-la.
- Orquestrá-la – corrigiu o velho tripulante.
- Orquestár-li-a.
- Orquestrá-la.
- Serei eu a fazê-li-a, pronto – rosnou o da cicatriz - Percebido?
A tripulação caiu em silêncio, comovida pela forte determinação do colega.
- É fazê-la… – murmurou o tripulante mais velho, coçando a barba e olhando para os pés.
- Hádes de me corrigir outra vez a ver o que te acontece! – rosnou o tripulante de cicatriz, colocando um gordíssimo charuto na boca – Discutiâmos agora a melhor forma de nos vermos livres daquele principezinho.
***
Smith continuara o seu passeio e parara por momentos perto de uma porta pequena. Lá dentro, vozes. Muitas vozes. Uma delas não sabia conjugar verbos, mas todas pareciam concordar numa coisa: Jack merecia ser humilhado ou, se possível, esventrado com bastante energia.
Smith procurou afastar-se corredor fora. Iria avisar os amigos. Todos eles corriam perigo, especialmente as tripas de Jack. Começou a correr e, como é tradição neste tipo de situações, um tripulante que empurrava um carrinho de frutas virou uma esquina e colocou-se à frente de Smith. Voou ele, voaram limões, maçãs e bananas. Smith bateu com a cabeça em cima de uma melancia, e o estrondo fê-lo fechar os olhos para se proteger da fruta que caía em cima dele.
***
- Que foi isto? – perguntou o tripulante das tatuagens, levantando-se. A tripulação ergueu-se de um salto e precipitou-se para o corredor.
***
Smith levantou-se com dificuldade, limpando uma enorme laranja esmagada na camisa. Olhou para cima. Pelo menos vinte homenzarrões, enormes, olhavam-no desconfiadamente.
- Boa tarde a todos.
- O que estavas a fazer neste corredor? – perguntou o tripulante da cicatriz.
- Sinceramente? Nada de especial, vinha só passear e…
- Ele ouviu-nos, pá – resmungou outro tripulante.
- Juro que não. A sério. Juro que não ouvi absolutamente nada.
- Está bem, está – o tripulante da tatuagem olhou em volta, pensativo - Levem-no para dentro.
Todas as Terças e Quartas, novos episódios de Smith e as Sereias
domingo, 28 de novembro de 2010
Altíssimos critérios
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
Como fazer dinheiro à conta da ingenuidade das pessoas
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
Eu faço greve porque posso, e tu fazes greve porque eu quero fazer greve. Vivam os direitos dos trabalhadores!
E aqui estou, em casa, quando devia estar na escola a trabalhar. A escola está aberta (penso eu), mas os meus professores avisaram logo que iam fazer greve e que por isso não teríamos aulas. Estão no seu direito. O seu direito inclui, é lógico, prejudicar o calendário das aulas e os trabalhos que estamos a desenvolver. É menos uma aula que eu e os meus colegas temos para terminar trabalhos que por si só já estão atrasados. Mas é um direito, e acabou-se. Eu percebo perfeitamente que o seu direito de se baldar às aulas e ficar em casa a descansar o intelecto está muito acima na sua lista de prioridades da sua obrigação primordial, que é educar-nos. E ainda bem que temos professores que lutam pelos seus direitos. Eu não quero professores que me dêem aulas, quero é pessoas que saibam reclamar de uma forma que mais ninguém senão eles e os alunos, os prejudicados, sentirão.
Não serei o único. Há muita gente que, graças ao altruísmo de quem faz greve, não pode apanhar o comboio, o metro ou o autocarro para ir trabalhar. O país pagará, em milhões, a imobilização de milhares de pessoas. Mas os sindicatos não querem saber.
Isto percebe-se, claro, nem que seja por um facto inegável: as greves resultam. Não só resultam, como foi graças a greves como esta que as grandes mudanças de política na História foram conseguidas. Veja-se a Revolução Francesa, ou o 25 de Abril. É claríssimo que, amanhã, todos os governantes e partidos da oposição se vergarão à vontade popular. “Caramba”, dirão eles, “Os trabalhadores têm razão. Vou agora comover-me durante alguns minutos, chorar, pedir desculpas públicas, e depois reverter todas as decisões tomadas neste Orçamento de Estado. E à tardinha vou para a rua, distribuir dinheiro”.
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Smith e as Sereias - Ep sód o 34
- Força, dá-lhe! – gritou Smith. Jack estava empoleirado na prateleira que segurava o título do post, e ia puxando as letras a que conseguia chegar. Tinha tirado dois “I”, porque eram as mais levezinhas, e agora estava a tentar arrancar o P.
- Pelo amor da Pescada – resmungava Ariel, apoiando-se numa estaca de madeira que segurava uma tabuleta de madeira – Vocês não conseguem fazer um protesto decente, sem destruição?
- Esses protestos pacifistas não aparecem nos televisores – esclareceu Smith, olhando em volta – Alguma de vocês viu por aí uma montra?
- Calma, calma! – pediu Lilith, que estava ao lado de Ariel e olhava cheia de preocupação para o topo do post, onde Jack já conseguira soltar o P e estava agora a trabalhar no S – Jack, por favor… Desce daí, ainda te magoas!
- Há que mostrar-lhe que já chega – disse Jack, a custo, puxando a letra com força.
- Vai ajudá-lo, Smith – pediu Ariel, suspirando – ele ainda se mata.
- Ok. Mas levantem bem os cartazes.
Ariel e Lilith ergueram os cartazes que seguravam. Ariel levantou a tabuleta de madeira, que dizia “NÃO À NEGLIGÊNCIA CRIATIVA”. O cartaz em cartolina de Lilith dizia “CHEGA DE ABANDONO, QUEREMOS JUSTIÇA”.
O que se passaria, afinal, é um mistério. Ariel e Lilith olhavam em frente, determinadas, para que…
- Sabes ler, certo? – perguntou Ariel, sarcástica.
Olhava em frente, dirigindo-se ao vazio que a rodeava sem…
- É a ti que me dirijo – disse Ariel – A ti.
Ariel apontou o dedo em frente. Na minha direcção. Espera…
- Mais uma! – gritou Smith, ajudando Jack a arrancar o “D”
- Lê-lhe a declaração – pediu Lilith, levantando mais a tabuleta.
Ariel tirou um papel do bolso, desdobrou-o e declamou, com pompa e circunstância:
- Como personagens principais das aventuras de Smith e as Sereias, e portanto como figuras centrais nesta série, vimos por este meio mostrar o nosso desagrado em relação à atitude do nosso autor.
O Autor engoliu em seco.
- Tem-se vindo a verificar uma acentuada descida da qualidade dos episódios, que muitas vezes são publicados com gralhas, erros, incongruências, exageros, histórias mal contadas, personagens por desenvolver e disparates vários. Os leitores, se existirem, com certeza sentem e lamentam o sucedido. E nós, como personagens, sentimo-nos no dever de lutar pelas melhores condições dramáticas, narrativas e gramaticais possíveis para assim cumprirmos o nosso dever com honra e brio.
Esperem lá, eu…
- Sendo assim – continuou Ariel, levantando a voz para me interromper – Não nos resta outra opção senão tomar conta deste episódio e fazer uma greve.
- Diz greve com mais força – pediu Smith, do alto do post – No papel está GREVE.
- Seja – resmungou Ariel – uma GREVE.
Uma greve?
- Isto significa que hoje não há episódio – explicou Lilith, com os olhos azuis afiados – Azar.
- Além disso – continuou Ariel, virando o papel ao contrário - temos uma pequena lista de exigências.
Calma, calma. Vamos todos ter calma. Vocês aí. Smith, Jack. Parem de vandalizar o meu post, por favor.
- Sim, ele tem razão – apoiou-me Ariel, olhando para cima e agitando o braço – Desçam daí. E a propósito – olhou para mim outra vez – “apoiou-me” é um bocado exagerado.
Ok, perdoa-me. Estavas a dizer…?
- Ela estava a dizer que temos algumas exigências – declarou Smith, aproximando-se ao lado de Jack – Eu acho que “algumas” é mau. Propus que fossem muitas. Esmagadoras. Para te lixar mesmo.
- Mas esta greve não é um ultimato violento – interrompeu Ariel, que parecia muito mais controlada que as outras três personagens – Não me venhas com elogios baratos.
Pronto…
- As nossas exigências são simples. Primeiro, exigimos que haja um maior cuidado com a forma como as aventuras são escritas. Isso inclui a correcção dos erros e das gralhas.
Ok, isso posso fazer.
- Segundo, exigimos que a história avance de uma vez por todas, e que haja uma drástica mudança do tipo de aventura. Estamos fartos de contracenar no Palácio, no Quarto do Principado, no Salão Principal… E afinal que raio foi aquilo dos Atlantes aparecerem do nada? Queremos desenvolvimentos decentes!
Espera. Isso já está a ser preparado. Ainda no último episódio vocês entraram os quatro no Nautilus para…
- Sim, pois – disse Jack, em voz alta – Para encontrar a “minha Rose”. Sabes há quantos episódios já ouço isso? Sabes há quanto tempo me prometeste tal coisa?
- Calma, Jack… - pediu Lilith, abraçando-o ligeiramente.
Não acredito que as minhas próprias personagens estão a chantagear-me…
- Terceiro – continuou Ariel – O Jack exige que o próximo episódio se chame “Smith e as Sereias e o Jack”, para compensar o facto de ele, como personagem central do enredo, ser o único de nós os quatro que não é citado no título. E ele exige também que as piadas com o seu nome terminem imediatamente.
Como devo reagir a isto? É talvez a primeira vez na história da ficção que as personagens se erguem contra o autor que as…
- Oh, poupa-me a emotividade – resmungou Smith – Hoje não há episódio e acabou-se. E se as nossas exigências não forem respeitadas, haverá mais greves e com mais personagens. O Namor e o Poseidon queriam participar hoje, mas têm outros compromissos literários.
Vocês não me podem obrigar a nada. Na prática, sou eu quem vos escreve. Quem vos criou. Quem domina o vosso destino.
- Ah, essa é outra! – lembrou-se Lilith – Queremos saber imediatamente como vai terminar a história. Para sabermos no que estamos metidos. A Ariel nunca mais ganha barriga, a Rose nunca mais aparece, eu nunca mais sei se acabo com o Jack ou não…!
Não, está fora de questão. Isso é demais! Isto é um escândalo! Eu tenho o domínio total sobre esta história e não tenho de me vergar às vontades de…
- Então conta com mais disto – disse Ariel, levantando a tabuleta – Chega de injustiça!
- Chega de injustiça! – gritaram os quatro.
***
O porão do Nautilus estava cheio de tripulantes, todos eles correndo de um lado para o outro na azáfama de dia de partida. As máquinas estavam a funcionar, e um ronco metálico e gordo fazia tremer ligeiramente as paredes e o mobiliário. No centro do porão, Lilith, Ariel e Smith pegavam nas suas malas e preparavam-se para explorar o submarino.
- Oh, não acredito! – reclamou Ariel, largando o saco que tinha na mão e atirando-o com força para o chão – O gajo enfiou-nos à força na história!
- Isto é abuso de poder! – reclamou Lilith.
O porão ficou vazio.
O porão continuou vazio. O Autor tentou remediar. Lá estavam Lilith, Ariel, Smith.
E agora não estão outra vez.
E agora, vazio.
***
- Nós avisámos que não ia haver episódio – disse Liilith, com um sorriso malicioso.
- E não nos tentes forçar! – ameaçou Smith.
Levantaram outra vez os cartazes.
- Chega de injustiças! – gritaram todos.
Pronto. Seja. As vossas exigências serão cumpridas. Podemos voltar para o normal decorrer da história?
- Nem pensar – disse Ariel, pousando o cartaz – O número de páginas do episódio já se esgotou. Está na hora do…
Não! Não está nada! Vocês já atrasaram demasiado a série para eu me deixar levar mais uma vez pelas vossas…
FIM
Todas as Terças e Quartas só haverá episódios do Smith e as Sereias se o nosso abusador Autor respeitar as nossas exigências.
SMITH teve aqui 2010.
terça-feira, 23 de novembro de 2010
Smith e as Sereias - episódio 33
Orlando Matias, o jornalista peixe-espada, mostrou a sua identificação à entrada e abriu caminho pelos polícias à entrada do Palácio. Uma enorme multidão reunira-se à volta dos jardins, segurando cartazes. Os rumores que indicavam que a bomba tinha tido mão atlante correram depressa, bem como a notícia da viagem do submarino Nautilus.
- Paz sim, Nautilus não! – gritavam os manifestantes, em histeria emotiva. Numa massa indistinta, com barbatanas, cartazes e escamas a roçarem uns contra os outros, forçava a entrada no palácio. As figuras da autoridade, com enormes conchas e búzios presos aos braços e usados como escudos, procuravam empurrar os manifestantes.
- Olhem! Olhem para isto! – berrou um peixe azulado, atirando-se para os pés de um dos polícias – estou a ser violentado! Isto é fascismo!
- É verdade, eu vi! – gritou uma medusa, de fita à volta da cabeça – O polícia é que o empurrou!
- Não seja fiteiro. Levante-se imediatamente e desimpeça a via pública – resmungou o capitão dos polícias para o manifestante.
- Está a obrigar-me a fugir e assim a esmagar as minhas liberdades individuais! Típico da sociedade de guerra em que vivemos!
- Há que compreender – dizia uma manifestante a um jornalista – Que a verdade por trás desta suposta viagem no Nautilus está escondida. Querem apenas a opressão dos povos e a destruição das minhas liberdades! Onde acha que eles vão? Vão provocar guerras!
- De que forma? – perguntou a jornalista.
- Não se está mesmo a ver? – a manifestante apontou para os polícias – Eles têm armas! Se têm armas, é porque vão armar escarcéu. E se vão armar confusão, é com certeza num país desfavorecido onde há muitas crianças pobrezinhas e esfomeadas a correr pela rua. E depois fazem tiro ao alvo com as criancinhas. Toda a gente devidamente informada sabe disso! É para isso que eles querem as armas!
- Mas nãos serão elas necessárias para repor a ordem pública? – perguntou a jornalista.
- Claro que não! Se as liberdades de cada um fossem respeitadas, não seria preciso qualquer tipo de autoridade! E para melhor demonstrar o quando amamos a paz e a justiça social, vamos ali partir a montra e queimar dois carros de pessoas totalmente inocentes.
- Ai, ai, ai! – gritava o peixe azulado, estendido a contorcer-se no chão – Tenho uma unha encravada! Ela está a esmagar a minha liberdade individual de não ter unhas encravadas! São com certeza os capitalistas!
***
- Nervoso? – perguntou Ariel.
- Eu? – resmungou Smith – Nem por isso. Estou a começar a ficar habituado a aventuras surpreendentes e que desafiam qualquer regra de um enredo bem cuidado.
- Também eu – disse Jack – Queres ajuda com a mala?
- Não, obrigado – respondeu Lilith, com um sorriso derretido.
Estavam os quatro no convés do Nautilus. A tripulação, à sua volta, corria com eficácia bem ensaiada, ocupando posições, carregando em botões, puxando alavancas, obedecendo a ordens e trocando curtas e murmuradas informações sobre cargas eléctricas, humidades, valores de pressão e localizações geográficas. Olharam em volta. Mesmo para Jack, a maravilhosa decoração do espaço era novidade, visto que a primeira, última e única vez que ali estivera fora ocupada a ameaçar a vida a um tripulante.
Havia um enorme cuidado em copiar aqueles salões franceses do séc. XVIII, estilo rococó, com conchas, algas, animais marinhos, motivos vegetalistas e tons suaves de azul, verde, vermelho e branco, bem como formas curvilíneas e exóticas a cobrir o tecto e as paredes. Mesmo os aparelhos, tecnologicamente avançados, estavam pintados com tons verdes e azuis que sempre associamos ao fundo dos oceanos.
O Capitão Nemo aproximou-se do grupo com a sua típica cara de frete.
- Bem vindos ao Nautilus. Os vossos quartos são na ala Oeste, junto à Biblioteca.
Estendeu a mão à sua frente e revelou quatro flyers coloridos.
- Este é o nosso guia. O Nautilus é uma construção enorme e complexa. Há áreas proibidas, áreas que não devem frequentar e áreas que, se frequentadas, significará a vossa morte imediata.
- Podemos usar a casa de banho e a cozinha? – perguntou Smith, levantando a mão como um miúdo na escola.
- Obviamente que sim.
- A mim, chega-me – Smith sorriu e cruzou os braços.
- Não queremos incomodar, Capitão Nemo – disse Ariel educadamente – Sabemos que não costuma dar guarida a ninguém no seu submarino e que este é um enorme voto de confiança da sua parte.
- A quem o dizes, Ariel – resmungou o Capitão Nemo – E tu – apontou para Jack – Vens comigo.
- Eu?
- Combinámos que serias o meu assistente pessoal.
- Ah, sim, claro. Como quiser, Capitão.
- Quanto a vós, podem ir a uma das janelas despedir-se do Palácio – sugeriu o Capitão – Vamos passar uma longa temporada longe dele.
Ariel e Lilith dirigiram-se a uma das janelas e colaram a cara ao vidro. Smith pôs a mão sobre o ombro de Jack.
- Não te preocupes. Se te acontecer alguma coisa de mal é só gritares. Irem imediatamente à tua presença e apoiar-te-ei moralmente quando estiveres a ser espancado pela tripulação que te odeia. Se eles não forem muitos posso tentar meter-me, mas não podes esperar que me suicide por tua causa.
- Obrigado, Smith – murmurou Jack. Despediram-se com um aceno e Jack seguiu o Capitão por uma porta de ferro.
- Lá vão eles – disse Smith, aproximando-se de Lilith e Ariel.
- Achas que ele fica bem? – perguntou Lilith – Não que tenha perguntado por alguma razão em especial. É só mesmo por curiosidade. Mesmo.
- Claro que ele vai ficar bem – disse Ariel, colocando um braço à volta da irmã – Esta viagem vai ser belíssima. Vamos visitar outros países, viver aventuras calmas e aconchegantes, e nada, absolutamente nada de mal nos vai acontecer.
- Sabes – disse Smith, pensativo – Acho que não é a primeira vez que um episódio termina com uma profecia desse tipo. E normalmente elas nunca se realizam.
- Claro que não. Chama-se “conflito” – respondeu Ariel – O autor desta história deve andar a ler alguma literatura sobre como montar enredos interessantes.
- Finalmente – resmungou Smith, olhando também pela janela – já não era sem tempo.