quinta-feira, 7 de junho de 2012

Não batam no gordinho: em defesa da Selecção de Todos Nós


Vamos lá ver uma coisa: o que se tem feito nos últimos dias é uma afronta. Lembrar aos jogadores que eles são infinitamente mais ricos que o comum dos concidadãos que estão a representar e que parte desse dinheiro é gasto em carros topo de gama é, convenhamos, aborrecido. Queria ver como reagiriam esses críticos caso tivessem um Ferrari e alguém lhes dissesse “Ouve lá, mas tu não achas que podias ter um carro mais modesto, ou pelo menos não andar para aí com umas tretas modestas sobre como estás a representar este ou aquele gajo que não tem que dar de comer aos filhos?”.

Isto não se faz. Criticar os políticos cuja reforma “não chega” é obrigação. Mandar prender os capitalistas que ganham milhares é imperativo. Agora, criticar o Cristiano e seus compinchas exactamente pelas mesmas razões? Não é patriótico, não é verdadeiro, não é coerente.

E vejamos: não é só o problema de se estar a dizer mal de quem nos representa (os jogadores, não os políticos). As críticas recentes à Selecção conduzem a um enorme mau estar no seio dos jogadores. Vocês não imaginam o que é uma pessoa ler aquelas coisas na imprensa nacional e depois conseguir, a esforço, pontapear uma bola ou fazer abdominais. É de Hércules. É de herói. É de Novo Conquistador. Só grandes homens aguentam a pressão.

E a gente pode pensar: se eles fossem uns atletas de alta competição, com vários anos de experiência em competições internacionais e rodeados por enormes equipas de psicólogos, nutricionistas, médicos, fisioterapeutas e tipos para lhes engraxar as chuteiras, a gente até lhes podia exigir que se deixassem de mariquices. Agora, os jogadores da Selecção são tão modestos como nós todos. São pessoas humanas. São os filhos e os netos de alguém. Também têm sentimentos. Também já foram bebés.

Isto não se faz a ninguém, muito menos a quem só nos quer bem. Não esquecer que é por nós que todos eles jogam, e é por todos nós que recebem tão bem. Não esquecer que aquelas pessoas que no Sábado vão correr durante noventa minutos estão a fazê-lo por cada um de nós lusitanos. Dizer que recebem muito dinheiro é subestima-los. Já vimos que isso os deixa tristes, e que pode até, sei lá, provocar-lhes beicinho; mas não é apenas com o amuo que se deve preocupar o português comum. Se Sábado não ganharmos (e do bem estar emocional dos nossos Representantes dependerá essa vitória) o país cai em coma. Criticar hoje e agora quem daqui a 48 horas vai andar de calções ao ar livre com o frio que deve fazer por lá, quem ainda sofre de jet lag da viagem, quem andou de charrete em Óbidos para mal das suas nádegas, enfim, quem se sacrifica a toda a hora e a todo o instante pelo nome de Portugal projectado no mundo, é cometer um crime odioso que só pode despertar afronta.

O país não pode desmotivar aquelas pessoas. O país deve ser o ombro no qual os jogadores, milionários, saudáveis e na flor da idade, vêm chorar desconsoladamente depois de serem maltratados com uma palmadinha emocional. Sejamos a rede que segura e ampara estes heróis e não a corrente de ar que os pode constipar. Sejamos a mãe presente e de braços abertos que os receberá mesmo aquando de uma derrota humilhante e precoce. Sejamos a força e a coragem que fazem as suas contas bancárias empalidecer de vergonha perante a lágrima salgada do país.

Viva Portugal!

2 comentários:

Jorge Azevedo disse...

Sabes que os jogadores da selecção não são remunerados por estarem na selecção? E, para além disso, qual é o problema de um individuo que gera muito dinheiro (como o Cristiano) receber...muito dinheiro?

Renato Rocha disse...

Caro Jorge,

Agradeço o seu comentário; não sabia que os jogadores participavam gratuitamente no Mundial. Isso fará do seu tempo gasto na Selecção uma espécie de voluntariado, o que me agrada particularmente.

Quanto ao "problema" de um indivíduo ganhar muito dinheiro quando o gera, estamos de acordo: não há nenhum. Acho que o texto que comentou lhe passou ao lado, já que esta era uma ironia à maneira como muita gente saiu em hiperbólica defesa do bem estar emocional dos jogadores e não uma crítica ao facto de ganharem muito dinheiro. Brinco é com a parvoíce de se achar desapropriado apontar a bruta ironia (que não é minha): os famosos descapotáveis são contrastantes com a realidade do país que os donos dos veículos representam.