sexta-feira, 2 de julho de 2010

A culpa é do chinês

Como sabem, eu não invento as histórias que ponho aqui. Tenho um pequeno escravo chinês que vive numa cave em Badajoz, um amigo meu alimenta-o e de vez em quando dá-lhe banho de mangueira. Isto não é para contar, ok?
De qualquer forma, o escravo chinês é que me vai escrevendo umas coisas, eu pago-lhe em biscoitos e em papel higiénico, e até já lhe prometi deixá-lo sair de vez em quando da jaula para apanhar sol e correr atrás dos gafanhotos para esticar as pernas. Quando tem uma história pronta, envia-me por correio e depois é só copiar para aqui. Para não me cansar comprei outro pequeno escravo chinês para me passar os textos a limpo. Tem uns dedinhos pequenos, muito ágeis. Dão jeito quando os cotonetes caem para trás dos armários da casa de banho.
Voltando ao que estava a dizer. Tenho andado à espera de histórias novas, e desde há uma semana nada. A caixa de correio vazia. Liguei para o amigo que me tratava do chinês, e ele disse-me que o chinês tinha escrito histórias sim senhor, e ele próprio as tinha mandado pelo correio. Estranhei.
Desci no elevador e bati à porta da porteira. Se houvesse alguma coisa que tivesse ficado fora da caixa de correio iria ali parar, era sempre a senhora que me ficava com as cartas. Ela abriu a porta, e senti o cheiro característico a bibelôs e sabonete. Ela cumprimentou-me, eu disse bom dia, como está tudo? E perguntei logo pelas cartas. A porteira levou a mão à testa, e procurou justificar-se com um sorriso ingénuo. Ela achava que eu não sabia que ela tentava ver o que estava dentro das cartas ao encostá-las à janela e procurar pelas transparências. Foi lá dentro, voltou com um pequeno monte de encomendas para mim. As histórias. Pediu desculpa outra vez, e disse que se tinha distraído. Dei-lhe um murro no nariz, sem força quase nenhuma, juro, e ela caiu para trás e rebolou pelo hall de entrada.
Quando a polícia cá vier vou dizer que ela me confundiu com outra pessoa com certeza. Eu era incapaz de tamanha barbaridade, e insistirei que um dia a vi a andar nua pelo corredor e a falar com as plantas. Não que isso tenha realmente acontecido. Mas eles não sabem. Vou agora comprar um terceiro chinês para me abrir os envelopes, porque são muitos e ainda tenho a mão dorida do murro que nunca aconteceu.
Histórias novas para breve,
O Autor
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