quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

A irmã mais feia

Estava arrependido, deveras arrependido. Não havia nada que o fizesse mudar de ideias. Quis chorar, chorou, ganhou coragem. Sentiu-se idiota, naquela casa de banho de hotel, esperando o momento para sair e dizer à sua esposa que a lua de mel estava acabada, que este casamento era um erro, que amava na verdade a sua irmã e não ela. No próprio casamento olhara para ela, para a irmã, no seu pequeno vestido laranja, flor enorme no cabelo, lábios carnudos e prometedores de um exotismo eterno, e sentira o coração derreter-se como margarina. Quando ela soubesse, ficaria louca. Louca. Seria capaz de uma loucura. Remexeu pelo armário da casa de banho, procurou as lâminas de barbear e as tesouras para unhas e deitou-as no pequeno caixote do lixo ao lado da sanita. Respirou fundo. Ganhou coragem. Saiu.

A sua esposa estava a chorar, sentada à beira da cama, de vestido de noiva amarrotado, telemóvel caído no chão. Levantou a cara das mãos, olhou para ele com um par de olhos esborratados por causa da maquilhagem. Parecia o Joker.

- Não… - murmurou ela, desfalecendo aos seus pés.

- Querida! O que se passou? – a razão do seu nervosismo desaparecera. Como podia pedir o divórcio àquela mulher, que no fundo chegara a amar, um dia?

- Houve uma coisa horrenda… A minha irmã… - disse ela, atirando-se para os seus braços, sem saber o que dizer, chorando desamparada. Ele empalideceu. O sangue desapareceu-lhe da cara, sentiu-se frio e quente ao mesmo tempo.

- Querida, tenta controlar-te… O que significa isso? O que aconteceu? – mas ele sabia-o. Sabia-o, e não havia nada a fazer. Restava-lhe empalidecer, e esperar pela eternidade num casamento sem amor.

- A minha irmã… Ela fugiu! – disse finalmente a sua esposa.

- Fugiu?

- Sim!

- E é por isso que estás a chorar? – ele é que estava à beira do desesperto, naquele momento – Como pudeste ser tão exagerada? Pensei que lhe tinha acontecido alguma coisa! Que tinha morrido!

- Que disparate! Ela fugiu, e deixou uma carta idiota e desesperada, dizendo que te amava, que apenas tu a podias fazer feliz, que te queria… que… oh meu amor!

A sua esposa caiu-lhe nos braços mais uma vez. Ele agarrou-a, atirou-a para cima da cama, tentou acalmá-la. A irmã dela. A mulher do vestido laranja, da flor no cabelo. Fugira por ele. Amava-o.

- Ouve-me. Para onde fugiu ela?

- Sei la! A minha mãe falou-me que ela foi para a América do Sul! Não sei! O que te importa isso?

Ele largou a sua esposa, atravessou o quarto, foi à sua mala. Procurou por entre os calções de banho e o casaco de cerimónias, e encontrou a sua carteira com dinheiro e documentos.

- Desculpa-me – disse ele, suando, fechando a mala, olhando para ela – Desculpa-me, mas há algo que devo fazer. Menti-te todo este tempo, mas agora chegou o momento de ser honesto. Tenho de ir. Perdoa-me.

- O quê? Estás parvo? – perguntou-lhe a mulher, parando de chorar, como que desperta de um transe psicótico de lágrimas. Ele precipitou-se para a porta, abriu-a.

Na entrada estava uma mulher lindíssima, de flor enorme no cabelo e vestido cor de laranja.

- Seu absoluto filho da puta! – gritou a voz da sua esposa, atrás de si. Virou-se, a tempo de levar o estalo. Virou-se para a irmã outra vez, a tempo de ver chegar os seus sogros.

- Eu avisei-te que ele não era uma pessoa honesta – disse a mão, as mãos agarradas e dedos entrelaçados, como quem se depara com a presença do demónio em pessoa.

- Mentiste-me! Como pudeste fazer-me uma coisa destas?! – gritou-lhe a esposa. Deu-lhe outro estalo, este mais reflectido, mais pensado, e que por isso doeu mais.

- Mas… - ele não conseguia compreender, olhou para a sua esposa, que voltava a chorar, para a irmã dela que lhe sorria com a maior sensualidade que já vira.

- Não devias ter olhado para mim naquela forma no casamento – disse-lhe ela, detrás de toda aquela beleza – E estares sempre a fitar-me o rabo quando íamos todos à praia também não ajudou.

- Eu sabia! Eu sabia! – dizia a sua esposa, atirando-se para cima da cama. A sogra correu para abraçar a sua filha, o sogro ficou a olhá-lo friamente do topo da sua cara de bulldogue – Ias fugir com ela! No dia do NOSSO casamento! Como foste capaz?!

Não sei, pensou ele. Mas se pudesse, teria fugido mesmo. Olhou para a irmã outra vez, uma beleza quase sobrenatural, depois para os seus sogros. Eram pessoas ricas, com posses, com bons advogados. O divórcio ia ser doloroso.

.

Sem comentários: