quarta-feira, 29 de junho de 2011

Samora 17


Só alguns meses depois, já perto da sua própria hora, é que Samora me confidenciou mais pormenores sobre o seu brevíssimo encontro com o pai moribundo.
- Olhou para mim, perguntou-me quem era. Respondi, Samora, seu filho. E ele olhou-me outra vez como se pesasse as palavras mas as esquecesse logo a seguir e repetiu, Quem é o senhor? Eu ia repetir-me também mas parei porque não sabia a resposta. Era seu filho? Chamo-me Samora? E depois? Isso não é o que eu sou, é o que sou em relação aos outros. Filho dele, amigo deste, vizinho da Sra. Primm. E Samora foi o nome que me deram quando nem sequer sabia que existia, antes de saber andar e ver o mundo. E é o nome de outros tantos que por aí andarão, menos inteligentes, é certo, mas também eles filhos de alguém. Não soube a resposta. Ele não me reconhecia como seu filho nem pelo nome que me tinha dado e por isso era como se não existisse, não sabia quem eu era porque tirando isso não me sobrava nada. Depois fechou os olhos e morreu-me. E eu ali de pé, à procura de mim. Deixei-me naquele quarto pavoroso e agora não sei encontrar-me.

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