quinta-feira, 30 de junho de 2011

Samora 18

Anos antes, num almoço a dois em que nos deliciávamos com morcelas:
- Já alguma vez conseguiu estar sem pensar? – perguntou-me - Falo de uma total ausência de reflexão ou imaginação. Zero. O cérebro quieto como que em hibernação.
Pensei por momentos.
- Talvez, em momentos de maior cansaço.
Samora levantou e voltou a descer as sobrancelhas. Parecia desapontado.
- Pelos deuses… A mim, nunca! Anulação do pensamento, como querem os budistas. Que medo! Qual será a vantagem de nada pensar? Não ver relações ou contrastes entre as coisas, não imaginar nada de novo, não questionar o que pensamos e pensar para que nos questionemos? E sem nada para poder expressar aos outros senão comentar que hoje se esteve à sombra de uma árvore a sentir o vento nas orelhas – levantou um dedo - A antítese do pensamento é a antítese do Homem e do que o distingue dos animais. Para plantas temos já os pinheiros.
- Dará paz de espírito.
- Que paz de espírito? A do desapegado ao mundo, que deseja ver e sentir apenas? Pureza, chamam-lhe eles. Onde está a pureza de não chegar a lado nenhum? Para onde iria a Humanidade se fosse pura?

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