- Sendo assim, analisemos esta questão com cuidado – propôs Samora enquanto limpava o suor com o lenço e observava as pessoas na praia – Quem apanha um escaldão fá-lo voluntariamente. Isso é claro. Não é coisa que se apanhe de um segundo para o outro, é necessária persistência. Se tal é o caso, a pessoa escaldada, chamemo-la assim, não terá qualquer justificação em reclamar com a sua condição.
- Ninguém gostará de escaldões – observei, com cuidado para não colocar os meus pés descalços ao sol.
- Ninguém, ninguém… – Samora dobrou o seu lenço e colocou-o no bolso – Há cremes para os escaldões, significa que haverá gente suficiente a tê-los voluntariamente.
- Não estará a exagerar? Um escaldão parece-me…
- Parece-lhe porque pensa que ainda estamos a falar de escaldões. Não estamos.
- Não estamos?
- Você pelos vistos está, eu não. O escaldão, voluntário e inegavelmente doloroso, é uma metáfora para aquilo que o Homem faz contra si mesmo e os outros. A História enche-se de costas escaldadas todos os dias.
- O que explica isso?
- O que explica isso? – Samora apontou para os banhistas - Estar de papo para o ar ao sol, inerte.
- Não estava a falar dos escaldões.
- Nem eu.
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