domingo, 25 de outubro de 2009

O Cereal Killer (8 de 12)

No dia seguinte, Jovial Trestonho acordou no meio da rua, estendido à beira de uma grande imundície de cão. Ao tentar, na noite anterior, entrar em casa, a porta recusara abrir-se, e aconselhou-o a procurar um advogado, pois todos os objectos de sua casa iam levá-lo a tribunal. Que remédio senão dormir na rua? Acordava agora com uma imundice de cão ao lado da cabeça, e quase a agarrou pensando tratar-se da almofada. Ergueu-se, e reparou que estava com dores nas costas. O chão conseguia ser extremamente desconfortável quando queria!

- Bem feito - disse o chão.

- Porquê? - perguntou Jovial, quase a pisar a imundice de cão.

- Todos os objectos da aldeia já sabem do que fizeste! - uma pedrinha voou do chão e veio bater na testa de Jovial, desprevenido.

- Au!

- Hum!- disse o chão, e virou-lhe as costas. Por momentos, Jovial esteve de pé sobre um gigantesco vácuo, mas o chão regressou para debaixo dos seus pés para se desviar da linha de mira de um lenhador que por ali passava. Tudo indicava que o lenhador não tinha casa de banho em casa, pois aliviou-se ali no chão. Jovial fez uma careta, e encaminhou-se para o local onde combinara encontrar-se com o capitão, também ele (Jovial, não o capitão) com vontade de urinar.

Momentos depois avistou o café, e reconheceu o porco preto e os dois perus estacionados à porta. Um deles, em segunda fila, tinha um bilhetinho no bico, que Jovial identificou como sendo uma multa; e ao olhar para as orelhas do porco, reparou num folheto publicitário a uma esfregona eléctrica. Interessado, aproximou-se, leu o folheto mas desinteressou-se rapidamente. Era demasiado cara, mesmo a prestações. Entrou no café e viu o capitão e os dois agentes da autoridade que tomavam o pequeno almoço. O capitão preparava-se para atirar uma bigalha de bolo de arroz ao ar e apanhá-la com a boca. Atirou-a, deixando os agentes da autoridade no completo suspence, mas a meio do voo a migalha deu uma de sua graça, e mudou a sua trajectória, indo aterrar dentro de uma chávena de chá. Riu à gargalhada, enquanto se afogava no chá, assim como os agentes da autoridade. O capitão corou de embaraço, e avistou Jovial a entrar.

- Jovial, bom dia! - disse, a limpar a boca com um daqueles guardanapos de papel de má qualidade que há nos cafés.

- Bom dia, capitão.

- Toma alguma coisa?

- Um café seria o ideal.

- Só?

- Com natas.

- Claro, claro... - disse o capitão, e aproximou-se do balcão para fazer o pedido. O empregado ouviu atentamente, e começou a chorar. O capitão perguntou-lhe o que se passava, e Jovial percebeu que se tinham acabado as natas.

- Deixe lá isso, não há de ser nada...- dizia o capitão, consolando o empregado com palmadinhas nas costas.

- Eu tomo um café simples, não há problema...- disse Jovial ao empregado. Este limpou as lágrimas e preparou um café normal, mas ao ver que se tinham acabado os pacotes de açúcar cometeu suicídio dentro do lava-louça.

- Pobre coitado... - disse o capitão - Devia estar numa carga de nervos...

- Ele só queria servir o cliente o melhor que podia - disse outro empregado, a olhar tristemente para o cadáver do colega - Era um bom rapaz.

- Sinto-me culpado... - disse Jovial, a sentar-se num banco. A migalha de bolo de arroz continuou a sua natação sincronizada dentro do chá, mas pouco tempo demorou até que se desfizesse.

- Incrível, só mortes! - exclamou o capitão, quando uma senhora de idade e sem dentadura bebeu o chá de uma vez.

- Vamos para um sítio mais calmo, Jovial. A nossa investigação começará hoje!

Saíram do café, e os agentes da autoridade subiram para os seus perus.

- Caramba! - disse Jovial. – Esqueci-me do peru!

O capitão olhou para ele de cima do seu porco.

- Deixe lá, eu dou-lhe boleia.

Mas, para surpresa de Jovial, o seu peru com defeito saiu de dentro do bolço detrás das calças.

- Bom dia a todos - disse, a mastigar um pouco de erva do dia anterior.

- Fantástico! - disse um dos agentes da autoridade, a rasgar a multa que o seu peru tinha no bico.

- Fala e cabe dentro dos bolsos das calças! - disse o outro agente da autoridade - Quem me dera ter um peru desses...

- Também eu... - disse o outro agente da autoridade. O seu peru começara a pastar.

- Quando acabarmos esta investigação tentaremos arranjar uns perus novos... - disse o capitão, e um sorriso iluminou-se na cara dos agentes da autoridade.

- Já tirou os restos de banana do posterior? - perguntou o peru de Jovial, e os agentes da autoridade riram a bom rir.

- Ah... cof... hum... bem... ah... vamos a isso, então! - resmungou o capitão, envergonhado. Deu com o chicote que trazia sempre consigo no rabo do porco, que relinchou e começou a correr. Os agentes da autoridade seguiram-no, a bordo dos seus perus, e Jovial montou o seu peru e seguiu-o também.

(continua)

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