quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Samora 36


Samora mostrou-me um gráfico desenhado a caneta preta, oscilante, formado por uma linha curvilínea que ora subia ora descia em relação ao eixo dos Y.
- Você ainda é novo para compreender, mas deixe-me que lhe diga que a vida pode ser representada num gráfico como este, ora ascendente, ora descendente. No eixo dos Y está a grandeza a que chamaremos, por facilitismo, Felicidade. Não me venha com definições que não lhas sei dar; seja a Felicidade o que quiser, que tanto me dá e a minha teoria mantém-se de pé. O eixo dos X é o eixo do tempo. Ao longo dos dias e dos meses e dos anos, momentos de felicidade são imediatamente seguidos de momentos de infelicidade, com o contraste entre os dois mais ou menos drástico mas sempre garantido; e a queda de Felicidade é directamente proporcional à distância que a separa do ponto de equilíbrio, a que chamei Indiferença. Quanto maior o valor de Felicidade sentida, maior a queda que se lhe segue. Num dia come a sua refeição favorita, no próximo tem cólicas; num dia morre-lhe um filho, no outro ganha a lotaria. Será algo assim. Daí que queira ao máximo manter-me quieto. Procuro que o meu gráfico se mantenha o mais próximo possível do ponto de Indiferença. Sentir felicidade, por maior que seja, é apenas sinal de uma queda substancial futura e garantida de um sentimento bom para um sentimento mau. É por isto, meu caro, que considero saber lidar com a vida. É aplicar-lhe uma função e desenhá-la com uma caneta que custa um euro e meio numa papelaria. É resumi-la numa folha de papel, e é adivinhar-lhe as voltas para a poder fintar com classe. Lembre-se disto da próxima vez que me perguntar porque não me caso, ou porque não tenciono extasiar-me nunca mais até morrer. 

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