sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Samora 45

Com os simples há que falar de forma a corresponder às suas capacidades – defendeu Samora, enquanto esperávamos que um dos funcionários enrolasse o presunto que acabáramos de comprar - A interacção social entre desconhecidos que partilhem uma temporária circunstância em comum parece, infelizmente, obrigatória. Quantas vezes não encetei já intermináveis diálogos com funcionários de gasolineiras, senhoras na fila do supermercado, ou com a empregada doméstica? Não chegarei nunca ao pé deles perguntando qual a sua opinião sobre Locke ou o que pensam dos epicuristas; ao invés, direi: “Como tem passado? Ontem choveu. De facto, os combustíveis estão mais caros. Ainda ontem tive de sair de casaco para a rua”, ad infinitum. Uma interminável lista de lugares-comuns que a mim me aborrece mas aparentemente faz as delícias destas pobres almas. Não há que culpá-las mas sim compreendê-las, da mesma forma que comunicamos com um cachorro com uma festa na cabeça. Lá porque somos mais inteligentes que o cachorro e lhe afagamos o pêlo não significa que estejamos a ser condescendentes; significa apenas que estamos cientes do enorme abismo que nos separa, e por isso descemos às catacumbas onde habitam os pobres animais.
 

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